A penúltima mensagem que trocámos com o nosso amigo Fernando Costa dizia qualquer coisa como, “Já falamos, vou nadar com os tubarões”. Passaram-se alguns dias sem saber nada desta surfista que largou todo para viajar pelo mundo até que, quando já receávamos o pior, recebemos outra mensagem. “Está tudo bem, hoje vou apanhar um autocarro para Jeffreys Bay que demora 11 horas, quando chegar envio novidades.” E foi o que aconteceu, Fernando chegou “são e salvo” a uma das melhores ondas do mundo e partilhou connosco esta sua incrível viagem que ainda mal começou!

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O que é que se faz quando se tem o trabalho perfeito, mas ao mesmo tempo se tem como maior objectivo e sonho de vida viajar o Mundo? Vai-se viajar! Foi o que eu fiz. O meu nome é Fernando Costa, tenho 27 anos e trabalho há 4 no melhor emprego do mundo, a organizar a etapa Portuguesa do Circuito Mundial de Surf – o Moche Rip Curl Pro Portugal. Para mim este é o melhor trabalho que poderia querer ter.

Mas acontece que ao mesmo tempo, o maior objectivo nesta fase da minha vida era viajar pelo Mundo, ver os 6 Continentes (7 para quem conta com Antárctida, mas esse fica para outra altura qualquer); conhecer as diferentes culturas e ter o maior número de experiências culturais possível. São estas as coisas que me fazem mais feliz, além da minha família e amigos (parece cliché, mas é mesmo assim).

Sendo assim, decidi partir para uma aventura de cinco meses a viajar pelo que me faltava no Mundo. Até hoje, estive dois meses a viajar pela América do Sul em 2009, três meses a viajar pela Austrália e Nova Zelândia em 2012, e vivi um ano nos Estados Unidos, onde também deu para passear um bocado. Sem ter qualquer plano definido, o objectivo passa por conhecer muito bem África e Ásia, e vai ser obrigatório passar 11 dias na Califórnia na despedida de solteiro de um amigo.

Quanto ao trabalho, foi posto “de lado” por enquanto, mas pode ser que volte. Se for possível, vai voltar, se não for, é por uma boa causa. Se não tivesse sido agora, não era nunca..

Hoje é Sexta-feira, dia 22 de Janeiro. Supostamente vou embora no dia 5, o que faz com que faltem exactamente 12 dias para ir embora. Tenho tido uns dias bastante agitados, desde estar preocupado com o trabalho, tentar ser profissional ao máximo, apesar de saber que a minha utilidade ali é praticamente nula. Aquilo que tenho andado a tratar é basicamente tudo o que é preciso para fazer uma viagem.

Hoje fui de manhã cedo à embaixada da China. É o único país a que vou que obriga a pedir visto aos turistas, não é nada fácil. Obrigam-nos a preencher um formulário enorme, com 4 folhas, em que perguntam tudo e mais alguma coisa (o normal dos Vistos, mas mais complexo).

Temos também, no caso de sermos empregados de uma empresa, de apresentar um Certificado timbrado, assinado e carimbado da empresa, que comprove que somos mesmo empregados da tal empresa! Para além disso, e isso para mim foi o pior, não nos dão o visto se não dermos uma prova de itinerário com entrada e saída da China confirmadas. Eu não faço a mínima ideia quando é que vou entrar nem sair, por isso não sabia o que fazer! A empregada do serviço consular disse-me, entre linhas, que bastava ser uma reserva, mesmo que não estivesse 100% confirmada nem paga, com o meu nome e datas. Foi o que fiz então: fui ao Skyscanner, escolhi o primeiro voo Lisboa-Shanghai-Lisboa que encontrei e andei até à parte do pagamento. Imprimi a página onde perguntam se quero confirmar a reserva, e entreguei na embaixada! Espero não ter problemas para receber o Visto, porque demora 4 dias úteis e daqui a 5 dias úteis é o Ano Novo Chinês, a embaixada fecha sexta, segunda e terça, e aí sobra-me apenas um dia até à viagem! Se acontecer alguma coisa, vou ter de adiar o dia da partida.

À tarde fui à consulta do Viajante. A consulta do Viajante tem muito que se lhe diga. Sempre ouvi falar dela, quando fui para a América do Sul só levei umas vacinas que demorei nem um dia a pedir no sítio onde as davam antigamente, em Sete Rios, praticamente de borla. Agora se calhar continuam a dar em Sete Rios, e seguramente dão em 8 ou 9 outros sítios. O problema é que liguei a tentar marcar em todos eles, e a vaga mais próxima era no fim de Fevereiro!

Restou-me então marcar consulta no “privado”, que é o Instituto de Medicina Tropical, na Junqueira. Demorou uma hora e meia, a consulta foi producente, pois o médico (que conhecia todos os pontos do Mundo ou pelo menos parecia!) deu-me muitas dicas acerca de que precauções tomar em cada um dos sítios onde vou (principalmente quanto à Malária, que parece que há muito mesmo e mata 900.000 pessoas por ano). Posso parecer ignorante por não ter noção que era tão perigoso, mas nunca tinha dado atenção suficiente a este assunto, nos sítios onde fui não havia perigo. Resumo da consulta: 83€! 53 da consulta, mais 30 de duas vacinas. Para além disso, ainda tenho que comprar os comprimidos para a Malária e mais dois remédios que o Médico mandou comprar.

Quarta feira, 5 de Fevereiro
Chegou finalmente o dia. Nem estou bem a acreditar, não dá para perceber o que sinto, pois tenho estado apático em relação à viagem, como vai correr, etc! Não tenho medo de nada, do género ser comido por um tubarão ou assim. Se acontecer alguma coisa, é a vida! Mas a minha apreensão tem a ver com o facto de não saber de todo como é que vai correr. Não tenho nenhuma dúvida que vai ser épico, a viagem da minha vida, mas por mais fácil que possa parecer, viajar 5 meses sozinho é complicado. São muitas coisas que se tem de saber, resolver, preparar, aguentar, etc! A ver vamos!! LET’S GO!!

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PRIMEIROS DIAS EM CAPE TOWN
Estou neste momento a meio da primeira semana da viagem, e parece que já passaram meses! Digo isto no bom sentido, pois tenho andado a fazer tanta, mas tanta coisa que nem dá para perceber bem.

Cheguei a Cape Town, África do Sul na Quinta-feira, dia 6. Ao principio quando cheguei, fiquei um bocado “à nora” pois tinha acabado de chegar a um país novo e tinha poucas noções de como as coisas funcionavam. Apanhei logo um autocarro para o centro da cidade, e outro directo para o Hostel, não podia ser mais fácil, quem dera a muitas cidades no mundo ter um sistema de transportes tão prático como este.

A primeira impressão não podia ter sido melhor. Uma cidade evoluída, agitada e simplesmente espectacular. É uma mistura entre Sydney e Rio de Janeiro. Sydney porque o centro da cidade é muito parecido, e Rio porque está envolvido por um conjunto de montanhas gigante chamada Table National Park. No meio destas montanhas, há uma que é maior que todas as outras, e está mesmo junto ao centro da Cidade do Cabo – a Table Mountain. Foi-lhe dado este nome porque é completamente plana em cima, portanto faz lembrar uma mesa. Este é o principal marco da cidade, a sua maior atracção.

Fui dar uma volta pela cidade, e pela sua rua principal – Long Street. Nesta rua passa-se tudo, de dia e de noite. Uma das pontas é o Centro Empresarial de Cape Town, e na outra é a zona dos bares, restaurantes, e onde se vai sair à noite. É uma rua sempre muito agitada e activa.

Depois de conhecer os principais pontos da cidade (faz-se tudo a pé em 1h30), e de almoçar num dos meus restaurantes preferidos, o Nando’s, voltei para o Hostel. Uma noite de Hostel (qualquer um decente) num quarto partilhado custa à volta de 14€ com pequeno almoço incluído.

As pessoas na cidade são todas incrivelmente simpáticas. Nota-se uma clara diferença entre os brancos e os africanos (é como eles chamam a quem tem a pele escura). São claramente mais os africanos (eu diria 60% africanos, 25% brancos e 15% indianos) e é possível reparar que os africanos são também os que mais trabalham nos serviços (restaurantes, lojas, bares, táxis, etc). Vê-se muita diferença entre pobres e ricos, e há uma grande mistura entre pessoas com bom aspecto e pessoas com mau aspecto. Em menos de uma semana pediram-me dinheiro mais de 50 vezes. As primeiras cedi, com pena. Só depois li que é considerado uma praga aqui e que não se deve ceder nem contribuir. Apesar de me estarem constantemente a pedir dinheiro, não me senti ameaçado uma única vez. A cidade é bem segura, e tem por todo o lado homens fardados denominados “Public Safety”, para evitar os pequenos problemas. Quanto às pessoas que se vê que têm mais dinheiro, podiam perfeitamente ser dos melhores bairros de Lisboa, Cascais ou Porto. São mesmo muitas as parecenças.

No segundo dia de manhã, quis conhecer o principal ponto de Cape Town, e então fui subir o Table Mountain. Para apreciar mais e conhecer melhor a cidade, decidi subir a pé. Demorei quase duas horas a subir os 6km que foram mais duros do que eu pensava. A subida era muito inclinada e deviam estar para aí uns 30º. Apesar disso, haviam bastantes pessoas nos seus cinquentas e sessenta anos a subir. Foi uma manhã muito boa, tendo em conta as vistas incríveis que pude ter no caminho. Depois, li que semanalmente acontecem acidentes com pessoas a subir a montanha, e que já morreram mais pessoas a tentar subir aquilo do que o Evereste (!)

Infelizmente, quando cheguei lá acima, a montanha ficou coberta por um nevoeiro cerrado. Deixei de ver o que quer que fosse. Dizem que é normal, a razão tem a ver com os ventos que vêm do Oceano e de Terra, sobem pela montanha e criam umas nuvens instantâneas. Estas nuvens até criam um efeito bem engraçado, porque descem pela montanha como se fossem avalanches. Mas foi azar elas terem aparecido neste dia, pois não consegui ver “ um boi” de lá de cima.

No dia seguinte, fui fazer uma das coisas que sonhava fazer há muitos anos, desde que o meu amigo Francisco Patrício cá esteve e me falou na existência desta actividade, para qualquer um: Mergulhar com tubarões brancos, dentro de uma jaula em alto mar!

A viagem começou às 10 da manhã e demorou duas horas, até chegarmos a uma terra chamada Hermanus. Partimos de barco para cerca de 500m da costa, a tripulação manda uma cabeça de atum e milhares de sardinhas e gordura à água, e nós entramos dentro de uma jaula à espera que os tubarões apareçam.

Mas nesse dia tivemos azar, porque não apareceu nenhum tubarão! Ou melhor, apareceu, mas apenas quando faltavam 10 minutos para o passeio de 2h30 acabar! Dizem que é um acontecimento raro, e eu acredito porque falei com umas pessoas que tinham ido uma hora antes que estavam todas excitadas porque tinham visto 5 tubarões! Ao menos vi pela primeira vez um tubarão branco, apesar de ter sido durante muito pouco tempo. É engraçado, porque o Patrício quando foi há quase 10 anos também não viu nenhum.

Por um lado fiquei irritado, mas por outro isto faz-me sentir descansado porque percebi que é muito mais difícil que pensava eu ser atacado por um tubarão quando estiver a surfar em locais considerados de perigo.  Se na praia com maior número de tubarões brancos do mundo, com isco, eles não aparecem, então não é tão fácil como eu pensava ser atacado!

Depois de uma troca de e-mails e uma pequena discussão, consegui receber uma nova data para ir fazer isto noutro dia. Mais à frente conto como foi..

Nessa noite (sábado) fui sozinho ver o que se passava na Long Street, a achar que ia voltar passado alguns minutos. Saí do Hostel pelas 9 da noite e voltei às 3.30 da manhã. Tive uma noite bem divertida, em que passei por quatro bares, todos cheios. Toda a gente sabe que os Africanos são pessoas muito bem dispostas e animadas. Isso, juntando com um bocado de álcool, fica a receita perfeita para uma noite ideal!

Informações inúteis sobre a África do Sul:
A moeda é o Rand, e a conta que faço, para ficar sempre a ganhar, é 1 para 10, ou seja, 10 rand equivale a 1 euro. Embora tenha sido assim recentemente, hoje em dia o € tem vindo a ganhar face ao Rand, pelo que em cada coisa poupo uns trocos. O preço das coisas cá é surpreendentemente parecido com as coisas em Lisboa: uma Coca-Cola custa 10 rand (1€), um McDonalds custa 60 rand (6€), uma cerveja num bar custa 25 rand (2,5€), por aí adiante.

Eles guiam do lado esquerdo da estrada. São um daqueles países no Mundo onde gostam de confundir os turistas…lembro-me perfeitamente quando fui à Austrália ter entrado numa rotunda em contra mão…

Acompanha a viagem de Fernando Costa pelo mundo em http://portugalaroundtheworld.blogspot.pt/

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