Os surfistas lusos marcaram uma forte presença num dos eventos mais impressionantes alguma vez realizado em águas portuguesas, o Nazaré Challenge. João Macedo era o único dos 5 com experiência neste tipo de eventos e ficou bem pantente que o surfista da Praia Grande é actualmente a cara do “big wave surfing” no nosso país. A ONFIRE falou um bocadinho com “de Macedo” para saber mais sobre o seu estado de espírito antes, durante e depois do evento…

João, conseguiste recentemente um resultado histórico para o surf português na Nazaré, como te sentes?
Numa palavra, “incrível”! Fiz mutos sacrifícios para conseguir este resultado e realmente abdicar de prazeres de curto prazo e apontar para algo maior traz uma felicidade mais duradoura. Senti isso noutros projectos como escrever o manual de treino da Surf Academia ou nos tempos iniciais na equipa de trabalho a fundar o movimento das Reservas Mundiais de Surf… Enfim momentos e tempos prolongados de imersão total num projecto, de trabalho com uma equipa com um objectivo concreto. Podia ter falhado, mas pelo menos sabia que tinha dado o meu melhor e isso é uma excelente sensação

Fala um pouco sobre a tua equipa e o teu estado de espírito na madrugada e véspera do evento…
A minha equipa core para o mundial de ondas grandes, e a preparação para esta etapa foi com o Zé Seabra, o Mário Almeida (TheSummit Sports Agency e EDP Mar Sem Fim), o Edu, Rabbit e Alessandro na ORG Surfboards, Jójó e o WaveCrushers System na apneia, Nuno Matos da Integral Coaching (mais nos meses anteriores), ZPPT Functional Training, Duda Tranquilo no Pilates e GlobalManu no Yoga. Isto para dizer que especialmente as sessões com o Zé fizeram que toda a pressão, excitamento, ansiedade e medo fosse tudo canalizado para tentar o meu melhor, para estar presente e acreditar em mim. É cliché, claro, mas não se imagina a pressão enorme que um evento destes traz para nós como surfistas. Aliado à pressão estão ondas colossais e isso traz o medo natural que advém de ver o mar tão bruto!
Mas realmente senti-me acima de tudo privilegiado de ser um wildcard, de representar Portugal, de estar a sentir pressão, na véspera e na manhã, e com isso ter a sorte de poder entrar dentro de água e mostrar o que valia. E depois, claro, muitas vezes sentia dúvidas. Será que me tinha preparado suficiente? As pranchas iam chegar de Espanha a tempo? Os nomes dos surfistas que estavam no meu primeiro heat não me iam dar hipótese, etc., etc… mas a grande lição para mim, foi que sentir pressão é um privilegio.

O que achaste do evento em geral e como achas que se compara com outros de ondas grandes e outras localizações?
Como sempre o Francisco Spínola e o Frederico Teixeira e a equipa da Ocean Events souberam criar o ambiente para mais um mega show de surf! A Praia do Norte é um lugar incrível – mais uma vez parabéns a eles! Trabalhei para eles nos anos da Rip Curl e na Sustentabilidade do CT em Peniche por isso sabia e senti logo que as condições base para todo o ambiente de espetáculo estavam montadas. Depois, como a Praia do Norte tem este particular ambiente de arena… como diz o Peter Mel – uma arena de gladiadores, e o evento foi espectacular…
Sem ser Puerto Escondido, onde não competi, porque já não estava no mundial, todas as outras ondas têm fundos de pedra ou reef, por isso são um bocado mais previsíveis e, onde as ondas quebram, há canal. Mas o principio é o mesmo em todo o lado do mundo, em todas as ondas grandes icónicas do mundo: para apanhar ondas e realmente surfar, o risco e a atitude base do nosso posicionamento é tudo. Para apanhar ondas grandes, tens que estar preparado para estar debaixo de água de ondas grandes.

Apostaste muito nas esquerdas mais perto do farol, fez parte de um “game plan” pensado com antecedência ou decidiste surfar ali quando analisaste as condições naquele dia?
São onde estão as ondas mais animais e verticais. Tinha visto isso logo de manhã. É uma parte perigosa mas realmente mítica da Praia do Norte. Acabei por, naturalmente, com a corrente também a empurrar para lá, me adaptar e quando a primeira esquerda veio ter comigo sabia que tinha que a agarrar… a prancha conectou super bem e a partir daí era o meu spot!

Achas que o teu conhecimento do pico jogou muito a teu favor, ou em condições assim tão extremas não é tão relevante?
Jogou claro, treinei o máximo possível em dias sempre diferentes, mas sabia-me mexer bem e tinha confiança em como estavam definidos os picos, embora distintos estavam definidos – sempre que não tinha aulas ou se havia um swell mesmo grande e tinha alguém para dar as minhas aulas ia para cima… coisa que não tinha antes tido oportunidade de fazer, com o trabalho na Surf Academia. Mas esta época disse: “vou arranjar tempo! O que é isto! Não importa as bad vibes e o que digam de mim no escritório!” e valeu!!

Mais uma bomba que contribuiu para o resultado de João Macedo. Photo by Pedro Mestre/Portuguese Waves

Mais uma bomba que contribuiu para o resultado de João Macedo. Photo by Pedro Mestre/Portuguese Waves

Consideras que no dia do Nazaré Challenge as ondas estavam no limite do que é possível surfar “a braços” ou há margem para maior?
Estava um dia que faz parte do limite, mas agora que se chegou a esse limite, o limite passou mais à frente e isso é muito emocionante fazer parte, literalmente estar a puxar os limites.

Conta o que este resultado fez ou poderá vir a fazer pela tua carreira a nível de oportunidades e patrocínios?
Tenho tido conversas mas nada de concreto… fico um bocado triste, com tanto feedback positivo, depois não ter apoios nenhuns financeiros. Não tenho apoios para correr o mundial, para me preparar melhor para o Nazaré Challenge de 2017, mas tenho esperança que isso mude. Vou investir em estar no próxima etapa com o meu prize money e a Bolsa TOUR do EDP Mar Sem Fim que ganhei. Estava a falar ao Alex (Botelho) em como realmente nesta fase da minha carreira o meu maior foco é Portugal, com os Açores e a Madeira como as áreas de exploração para ondas novas, mas depois do resultado é digerir algo que acredito tanto: haver mais Portugueses no mundial de ondas grandes, mais Portugueses com nomeações XXL, mais grandes surfistas de ondas grandes, tenho que manter a luta o melhor possível, com o meu “day job” que é dar aulas de surf na Surf Academia (www.surfacademia.com) e esta paixão e destino.

É viável fazer uma carreira como surfista de ondas grandes?
Para alguns até é! E gosto de dizer, para esses que tiveram essa sorte e mérito claro, bom para eles! Pelo menos são surfistas e não ciclistas ou pessoal do ténis a ganhar mais. E assim espero encontrar o patrocinador certo que acredite no meu perfil e as minhas valências.

Consideras este como o resultado mais relevante da tua carreira?
Foi o melhor. Fiquei em 4º lugar no ranking do mundial no ano em que o Peter Mel foi campeão e isso foi incrível porque é um resultado de Ranking Final de ano mas, sem dúvida, numa etapa foi o Nazaré Challenge.

Como descrevias a tua prestação no evento?
Dei tudo! Sinto que na final tentei mesmo com aquele drop animal, quando passavam os jactos da Força Aérea Portuguesa, ganhar. Mas os air drops a esta velocidade são coisas que ainda estão para lá do limite. Sei que fazem parte do futuro e isso é espectacular sentir, porque foi mesmo por pouco.

O que se segue para ti?
Já analisei heat a heat o campeonato e vou fazê-lo novamente com o Zé. Estou a trabalhar numa nova fase da Surf Academia em que saímos do Cascais Surf Center e o foco está de volta as raízes de há 15 anos atrás, na Praia Grande, o que é muito emocionante. A preparação de dar muitas aulas no Verão na Praia Grande é fisicamente brutal e isso é o início da preparação para o Nazaré Challenge 2017, sendo que estou atento a Todos Santos para fechar a época e o campeonato mundial de ondas grandes deste ano!!

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