Viver como surfista profissional não é algo fácil de concretizar. Na categoria feminina ainda mais difícil é. É uma carreira volátil, com um percurso cheio de dificuldades e limitado a apenas alguns com o perfil e talento certo. Há poucos anos Carol Henrique vivia no Brasil e para si o surf profissional não parecia ser uma realidade. Mas a irmã do ex-top do CT, Pedro Henrique, tinha um sonho e foi atrás dele. No nosso país não se abriram muitas portas mas Carol nunca baixou os braços e com uma série de resultados muito expressivos colocou-se “no mapa”. A recompensa mais recente foi um convite para competir nos trials do Corona Bali Protected, uma oportunidade que transformou mais uma vez num grande feito para o país que passou a representar, Portugal. A ONFIRE falou com ela pouca horas depois de ter participado no evento para saber mais sobre a experiência de ter sido a primeira surfista portuguesa a competir numa etapa do Championship Tour fora do nosso país, e o seu percurso até aí.

Carol, começando com um tema recente, como surgiu a oportunidade de competir nos trials do Corona Bali Protected?
Eu recebi o convite quando estava na etapa da Liga MEO Surf do Porto. Foi um convite que eu não estava à espera, uma coisa totalmente nova para mim e fiquei super animada. Comecei a treinar bastante, já pensando na onda de Keramas. Treinei mais na Ericeira, para a direita em fundos de pedra, já a pensar nos trials e no campeonato.

Quem eram as adversárias mais perigosas dos trials?
Eram 6 meninas no total, para mim a adversária mais forte era a Kirra Pinkerton. Ela é muito nova, tem 15 anos, mas é muito consistente e compete bastante na Califórnia. Tinha mais umas miúdas da Indonésia que não competem no QS, mas sabiam surfar muito bem.

Como estavam as condições nos trials e como foram as ondas que te levaram à vitória?
Foi uma final bastante disputada porque o mar estava bem “lento”, a maré estava a começar encher. Estava a dar umas pausas muito grandes, 20 minutos, e as ondas bem pequenas. Era difícil ter uma boa estratégia com essas condições e comecei perdendo. Precisava de um 6.9 e calhou que eu estava com a prioridade na hora certa, quando entrou um set, e eu fiz um 6.2. Depois fiquei precisando de um 4 e faltando uns 5 minutos para o final consegui apanhar uma onda, fiz um 5 e acabei vencendo. Mas foi muito disputado.

 

 

Como foi a sensação de estar no meio das melhores surfistas do mundo numa etapa tão importante?
A sensação é incrível. É a minha primeira vez em Bali e poder surfar essas ondas e ainda poder competir acho que é uma oportunidade única e estou bem feliz. Acho que o que eu estou a viver aqui vai me ajudar muito para o resto do ano, vai me dar mais força e mais motivação, estou com uma sensação de satisfação maravilhosa.

Como foi competir contra elas, sentiste alguma pressão colocada pelas surfistas do CT?
Eu não tinha pressão porque eu não estou a disputar ranking nenhum, não sou atleta do CT. Mas eu senti a pressão no caso da competição, de querer apanhar uma boa onda, de querer fazer uma boa onda. Senti uma preocupação de escolher bem as pranchas, escolher onde vou surfar, como ia fazer a leitura da onda, acho que foi mais essa a minha preocupação.

No início do primeiro heat apanhaste muitas ondas. Foi estratégia ou as ondas estavam tão boas que não dava para as deixar passar?
Não entrei a pensar nisso, mas como apanhei logo uma onda rápido e fiquei com a terceira prioridade. Entravam ondas muito boas e eu realmente fiquei um pouco confusa porque via ondas a passar e a formar na bancada. Acho que depois eu quis mais surfar, colocar a prancha no pé, poder surfar naquele mar só eu e mais duas e elas nem estavam onde eu estava.

Quem foi a surfista que mais te impressionou e porquê?
Acho que foi a Lakey Peterson. Ela é bem focada naquilo que ela quer, e mostrou bastante isso na nossa bateria. Obviamente que eu também queria vencer, mas também tinha um grande respeito, ela me impressionou bastante pela responsabilidade e a forma como surfou. Foi bem segura, e foi bom, mesmo sendo contra mim eu adorei estar ali ao pé dela.

Que pranchas trouxeste para este evento?
Foi uma coisa em cima da hora mas consegui fazer duas pranchas, 5’7” e 5’8” do Almir Salazar, da Polen, já a pensar nesta onda. Trouxe quatro pranchas e uma “normal”, que eu sempre surfo com ela, usei-a até na etapa da Liga MEO Surf da Ericeira. É uma prancha que eu gosto bastante em ondas para a direita. Senti-me bem com as pranchas. Podia, se tivesse tido mais tempo, ter trabalhado melhor nas minhas pranchas mas estou bastante satisfeita como elas funcionaram aqui.

Qual é a próxima prova para ti?
Vou directa para o México, para o Los Cabos Open of Surf, uma etapa 6.000 pontos do QS. Acho que a onda daqui parece bastante com a onda de lá, uma direita também, fundo de pedra. É o meu próximo desafio e vou tentar treinar bastante aqui para estar bem preparada para essa etapa.

Quais são os objectivos para 2018?
Os meus objectivos são vencer uma etapa do QS, uma 6.000 pontos. É o meu maior desafio, acho que fazer bons resultados no QS não é fácil, são baterias bem disputadas. É bem diferente de competir no CT, o QS tem mais baterias, são muito mais miúdas, então exige muito mais.

 

 

Falando um pouco do teu background, há quantos anos estás em Portugal e como estava a correr a tua carreira no Brasil?
Cheguei há 4 anos. Eu competia em campeonatos amadores, que serviam muito de base para mim, mas eu não tinha uma carreira no Brasil como surfista.

O que esperavas encontrar à chegada?
Para mim foi tudo novo. Eu não sabia para onde estava indo, o meu irmão, o Pedro (Henrique), me convidou para passar um tempo com ele e me contou, como era, das ondas, que era muito bom para treinar. Eu tinha terminado os estudos e achei que era uma boa oportunidade. Ter um irmão em Portugal que me estava a convidar foi bom mas eu não tinha uma ideia do que seria. Só sabia que ia parar no Aeroporto e que o meu irmão ia lá me buscar.

Como tem sido a recepcção dos surfistas portugueses em geral?
No começo foi mais aquela coisa, ninguém me conhecia, não sabiam quem eu era, o que estava a fazer. Foi difícil no começo mas depois conheci muitas pessoas que ajudaram. O Alvaro (Costa), da Polen, me ajuda bastante. O Tiago (Sampaio), da Fonte Viva, também foi uma pessoa incrível, que me ajudou bastante no começo. O meu irmão também me apresentou a muitas pessoas e mostrou-me Portugal. Acho que hoje as pessoas já sabem quem eu sou, sabem a minha história, então eu não sinto muito essa diferença.

Quais são as tuas ambições?
A minha ambição, aquilo para o que trabalho, é estar no Championship Tour. Eu acho que esta etapa aqui mostrou muitas coisas, que vale a pena. Às vezes uma pessoa tem que abrir mão de muitas coisas para alcançar um sonho, e a minha maior ambição é estar no CT a competir com as melhores do mundo. É para isso que eu surfo, quero melhorar mais e mais. Agora é trabalhar, pensar dia após dia, também não ficar sonhando muito, ser realista e trabalhar.

Quais são as grandes dificuldades que tens encontrado para cumprir as tuas ambições?
Eu acho que a minha maior dificuldade, sinceramente, é superar a mim mesma. Acho que chega num certo nível em que é difícil continuar evoluindo, então tem que se trabalhar duro, tem que se acordar cedo, fazer as coisas como deve ser. Acho que a maior dificuldade é continuar motivada todos os dias. Continuar a acreditar todos os dias que é possível, que é possível competir e vencer heats. Não só vencer campeonatos mas inspirar as pessoas ao meu redor e, quem sabe, poder deixar uma mensagem. Seja no surf feminino em Portugal ou no surf mundial. É para isso que eu treino.

 

 

Hoje em dia já tens alguns patrocínios, quais são?
Estou com a Hurley, Polen Surfboards, God/SurfSkate, Fonte Viva, Tribe34, BoardCulture Store, Health Club Visconde e Açai Anaue.

Para terminar. O big boss da Hurley, Bob Hurley, deixou um comentário muito positivo no teu instagram, como é a tua relação com o fundador da marca? Que contacto já tinham tido anteriormente?
O Bob é uma pessoa incrível. Ele tem uma energia que é incrível, eu adoro estar perto dele. Ele assistiu à minha bateria dos trials, e acho que o comentário foi muito em relação a ela. Falou um pouco de como foi ali, foi bastante difícil, comecei perdendo, depois ali ele viu um pouco a vontade que eu tive para vencer aquela bateria e mudar aquela situação. Ele é incrível, gosta do meu surf, está sempre a mandar mensagens de motivação e é uma pessoa muito inspiradora.

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