Quando se questiona sobre quem foi o melhor surfista que nunca foi campeão mundial, nomes como Rob Machado, Cheyne Horan, Gary Elkerton e, mais recentemente, Filipe Toledo, são regularmente citados. Mas há um nome que se destaca mais, Taj Burrow, um australiano que durante quase 20 anos foi um dos grandes destaques do tour. Taj reformou-se do surf competitivo sem o merecido “caneco” mas ficou com o reconhecimento não só dos seus pares como do público em geral como um dos melhores surfistas de todos os tempos. Recentemente Burrow esteve em Portugal para prestigiar o EDP Billabong Pro Cascais e, entre muitas horas a fazer o webcast e uma bateria épica com Tiago Pires, contou à ONFIRE como é a vida de reformado do tour e não só…
Taj, estás fora do tour há quase 3 anos, foi difícil a adaptação a uma “vida nova” depois de tantos anos no circuito?
Sabes que é engraçado pois estava realmente preocupado com isso. A vida no tour é muito intensa, estás sempre num avião ou a preparar para o próximo evento, é “full on”! Estava preocupado que tudo parasse e que eu não me adaptasse a isso, mas foi uma transição muito tranquila. Tem sido incrível passar mais tempo em casa, agora que tenho uma família é bom ter uma vida mais calma. Achei que ia ter muito tempo livre mas tem sido o oposto, acho que toda a gente sabe que estou disponível por isso estão sempre a tentar que eu faça parte de alguma coisa mas estou muito contente com a vida que tenho agora, tem sido bom.
Como é a tua rotina agora?
Entre tomar conta da nossa filha pequena, eu tento surfar o máximo possível e faço o que os meus patrocinadores me pedem, a Billabong tem me mandado em algumas viagens. Tenho tentado manter-me ocupado, e em forma por surfar muito. Além disso, se vir ondulações a entrarem para os locais que mais gosto, em outras partes do mundo, vou. Tenho ido muito a Bali, que é uma viagem de 3 horas de avião, vou muito no inverno quando entram boas ondulações e o tempo está mau no Oeste da Austrália.
A Billabong tinha grandes planos para ti quando te reformaste? A exigência fora do tour é grande?
Não, mandam-me em alguma viagens, como esta a Portugal para fazer comentários durante o evento, um heat com o Tiago Pires, abertura de loja e entrevistas, mas é tranquilo, posso surfar bastante entre compromissos e até experimentar pranchas diferentes…
Que tipo de pranchas estás a usar?
O meu quiver está completamente diferente agora. Ainda tenho algumas pranchas “standard” mas, por exemplo, quando estava no tour todas as pranchas era iguais e isso tornava-se um pouco monótono e repetitivo. Agora posso usar todo o tipo de shapes diferentes, muito divertidos de surfar. Faz-te surfar de maneira diferente, antes eu era muito crítico na maneira como surfava, agora não me preocupo tanto, perco secções, faço linhas diferentes e coisas diferentes nas ondas e fico contente com mais facilidade. O Matt Biolos (shaper da …Lost) faz muitos shapes mais alternativos e diferentes e agora estou na fase da minha carreira em que posso realmente surfar com elas e usar toda esta gama de pranchas que ele faz.
É difícil viver sem um objectivo competitivo depois de tantos anos com esse foco?
Eu sempre tive o objectivo de ganhar o próximo campeonato, agora que não tenho objectivos é fácil de nos tornarmos um bocado preguiçosos e não treinar tanto. O que eu tento fazer é criar pequenos objectivos. Quando soube que vinha a Portugal e que ia competir contra o Tiago, criei o objectivo de surfar mais em casa, para me preparar. Se a Billabong quiser que eu faça alguma coisa para o ano, uma surf trip, eu começo a preparar-me para surfar bem nessa viagem.
Ainda segues o tour de ponta a ponta?
Eu acompanho muito, se a hora for favorável com a do Oeste da Austrália eu vejo o evento todo. O do Tahiti foi incrível, vi tudo, adorei, ainda sou um grande fã do surf.
Sentes falta de estar no tour?
Não, de modo nenhum. Às vezes, se as ondas estiverem muito boas, como no Tahiti, adoraria estar lá mas não sinto falta. É difícil viajar tanto e estar com tantos surfistas agressivos na água, eu prefiro surfar sozinho. Já não sinto falta de estar rodeado por esse ambiente competitivo, fiz isso por demasiado tempo, foram 20 anos disso.
Nunca vês uma bateria e ficas a pensar que terias vencido?
(risos) Sim, eu penso isso às vezes, mas não me inspira a voltar, estou feliz de estar a ver.
Voltando um pouco ao passado, ao início da tua carreira, foste o primeiro e único surfista na história do tour a conseguir a qualificação para o Championship Tour e recusar a vaga na primeira qualificação. Olhando para trás, o que retiras disso? Foi uma boa aposta?
Sim, foi bom para mim porque resultou bem e consegui qualificar-me no ano seguinte. Se não tivesse conseguido a qualificação teria sido muito humilhante (risos), mas felizmente funcionou e não teria mudado nada. Foi um pouco assustador na altura, mas eu tinha 17 anos mas senti-me confiante que poderia qualificar-me mais tarde, e consegui. Senti que entrei na melhor idade para o CT, estava mais preparado.
É surpreendente para ti que mais ninguém o fez desde aí?
É verdade, nem eu recomendava agora (risos), porque é difícil, foi uma decisão radical e funcionou para mim mas acho que mais ninguém o fará.
A Brazilian Storm já estava forte quando ainda estavas no tour mas agora está “ao rubro”. O que achas desta dominância dos surfistas brasileiros e porque razão não há australianos neste momento a fazer o mesmo?
Na minha opinião, eles estão a dominar por completo. Sempre que há um evento as minhas escolhas são tipo o Gabriel (Medina), Filipe (Toledo), Ítalo (Ferreira), eles são incríveis. Eu sinto que, comparando com outros países, o surf é relativamente recente no Brasil mas eles chegaram a aquele ponto em que estão a dominar. Eles parecem ser naturalmente feitos para o surf, sempre em forma e com muita flexibilidade, surfam como ginásticas, são muito bons e provavelmente vão dominar por muitos anos. Há muito menos australianos no top10 agora, a vida na Austrália é muito boa, toda a gente surfa mas se calhar não têm a garra dos brasileiros, que podem sair de meios mais humildes e ter uma vida melhor através do surf. Então agarram melhor as oportunidades, querem mais que os australianos.
Para terminar, o que achas do Surf Ranch, gostas do evento (Freshwater Pro)?
Não gosto do evento, parece divertido de surfar, as ondas são incríveis mas não gosto do evento, acho um bocado aborrecido. É uma onda que gostava mais de surfar pessoalmente que ver outra pessoa a surfar. Eu gostava mais de ver o evento de volta a Trestles. Tanto Trestles como Cloudbreak (Fiji) são duas provas que fazem falta no circuito. No entanto, tendo dito isto, as piscinas de ondas estão a ficar tão boas que tenho vontade de surfar lá, mas não em competição.
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