Até há pouco tempo atrás, Kepa Acero era um surfista do WQS como qualquer outro. Fora dos circuito europeus e mundiais era mais conhecido por ser irmão de Eneko um ícone do surf europeu. A sua carreira competitiva é digna de nota e vale destacar algumas finais em WQSs e a disputa do título Pro-Junior Europeu com Tiago Pires. Até que o seu rumo mudou e este pequeno basco dedicou-se a descobrir ondas sem ninguém e documentar as suas viagens. Ao fim de alguns anos o seu trabalho deu frutos, ganhou reconhecimento internacional e até elogios de Kelly Slater. A ONFIRE quis saber mais sobre o seu projecto, que ficarás a conhecer neste exclusivo www.onfiresurfmag.com

Kepa, fala-nos do teu projecto?
Bom, eu gosto muito de viajar e gosto muito de competir também. Mas senti que andava a viajar pelo mundo sem realmente conhecer os sítios para onde estava a ir. Depois entrou a crise e eu fiquei sem patrocínio principal, por isso decidi fazer o que sempre sonhei. O meu sonho era ir à procura de ondas e, pelo caminho, conhecer os locais nas suas raízes, as pessoas, a cultura e a natureza e assim recriar o espírito de aventura que o surf sempre teve. Isso era a base do meu projecto. Tinha algum dinheiro e pedi algum crédito à minha mãe para isso. Agora estou no meu quarto projecto.

Onde já tiveste até agora? Nos últimos anos explorei os cinco continentes. Namíbia, Indonésia, Austrália, Chile, Alasca… e ainda há muitos locais por explorar.

Achas que o projecto mudou a maneira como tu surfas hoje em dia?
Sem dúvida, sim! Foi difícil mudar quando deixei de competir porque estava muito habituado a surfar conforme o critério de julgamento. Aos poucos comecei a perceber que é óptimo competir, mas há todo um mundo fora daí! Agora é só diversão, apanhar a onda e sentir a natureza, surfar com pranchas diferentes… é óptimo!

Foi difícil largar tudo para ir perseguir este sonho?
Bom, creio que isso depende da pessoa. Para mim a pior parte é antes de sair… ir para o Alasca sozinho à procura de ondas… Não sabes para onde vais e “saltas” para um avião à procura de ondas. Começas a tua aventura, está nela, é uma sensação incrível.

O que fazias antes?
Competia no WQS com o meu irmão Eneko e alguns amigos. Foi uma boa experiência. Às vezes as pessoas confundem as coisas, competidor ou free surfer… no fim de contas somos todos surfistas, gostamos de apanhar ondas e fazemos disso a nossa liberdade!

Como foi o apoio dos patrocinadores no início e agora?
No início, quando apresentei o projecto pela primeira vez, ninguém na indústria acreditou em mim. Excepto a Pukas, que sempre me apoiou e a quem estou muito agradecido. Mas avancei com ele e naturalmente os patrocínios apareceram, a VSTR, REEF, Arnette, Patagonia e a Casio. Todos eles gostam do meu projecto e deixam-me continuar a fazê-lo como eu quero, à minha maneira. Isto tem sido uma grande vitória pessoal. Por outro lado penso que a indústria focou-se muito em fazer dinheiro e perdeu a perspectiva do que realmente acontece na praia, o local de onde vieram! E não era assim antes. Eu acho que a indústria devia por mais ênfase nas raízes e devia ser mais visionária!

Quais foram as melhores ondas que apanhaste?
Há muitas ondas pelo mundo, não sei. Talvez as melhores tenham sido nas Panaitan…

Quanto tempo mais vais fazer este projecto?
Enquanto conseguir, eu adoro fazer isto. Os meus contratos são anuais, por isso cada ano parece ser o último. Mas já passaram três anos, espero que haja mais alguns, é como viver um sonho!

Qual foi a experiência mais assustadora?
Provavelmente andar nas ruas do Peru. É um sítio muito perigoso para turistas. Eu diria que é mais assustador na cidade que nos locais mais selvagens!

Qual foi a parte mais difícil?
Descobrir locais sem ninguém, investigar as marés, esperar por um bom dia, por boas condições. Leva o seu tempo. Também é difícil dizer adeus às pessoas que conheces, sabendo que provavelmente nunca os verás de novo.

E a melhor parte?
Quando apanhas boas ondas… é incrível. Depois de muito trabalho tu estás ali e as ondas estão tão perfeitas e tu lembras-te das pessoas que conheceste no caminho, o caminho que fizeste, a experiência… tudo está na tua cabeça naquele momento e depois!

Achas que qualquer pessoa pode fazer isto ou não é para todos?
Nem toda a gente pode fazer isto, tal como eu não era capaz de fazer coisas que outras pessoas fazem. Mas eu acho que as pessoas deviam tentar fazer o que gostam, dependendo das suas possibilidades claro.
Às vezes a nossa sociedade mete fronteiras ao ser humano e nós não fazemos nada para contrariar. Tornamo-nos preguiçosos e temos medo. E penso que a vida é uma grande oportunidade que não pode ser desperdiçada. Tens de fazer a tua própria história e isso começa num primeiro passo.

As tuas aventuras fazem lembrar uma versão surf do filme “Into The Wild” (o lado selvagem) mas sem o fim trágico, claro. Conheces o filme? E se sim, ele influenciou-te? Sim, é um filme muito inspirador. Eu gosto de ler os livros que ele leu e dou graças às pessoas que os escreveram pois partilharam momentos muito inspiradores! Também gosto de partilhar as minhas experiências com as pessoas, não há sensação melhor do que partilhar.

Nas tuas viagens o que levas além de roupa, pranchas e cameras de filmar?
Levo a minha tenda, saco cama, isqueiro e aquelas coisas básicas. E quando estás na “estrada” percebes que precisas ainda de menos do que isso. Quando viajas assim percebes que não podes levar mais do que o que consegues carregar nas tuas próprias mãos. É muito simples!

Para terminar, qual a coisa mais importante que aprendeste nas tuas viagens?
É difícil dizer. Está certo que aprendi muito sobre o surf mas as melhores memórias que tenho são das pessoas. Partilhar diferentes estilo de vida e culturas. Isso abre a tua cabeça para apreciares o mundo fora do teu país mas também quando estás de volta ao teu país perceber o quão especial nós somos com outra perspectiva e aprendes a amar mais o teu país!

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