Ser surfista profissional é, para muitos, mais que um sonho, é um objectivo. Até recentemente esta era uma carreira acessível para quem tivesse talento e uma boa capacidade de gestão e promoção, independentemente da sua classe social. Uma prancha, um fato e alguns acessórios eram o suficiente para “arrancar” na direcção deste sonho mas, à medida que o surf foi evoluindo e a profissão foi ganhando dimensão, as exigências foram aumentando substancialmente e com isso um elevado investimento financeiro passou a ser essencial.
Salvo raríssimas excepções, praticamente nenhum surfista em ascensão consegue estar entre os melhores da sua geração sem um forte investimento por detrás, de modo a ter acompanhamento de treinadores, fazer viagens e ganhar experiência competitiva para acompanhar o “pelotão da frente” e manter-se na “corrida” por um lugar de destaque. E quanto custará esse percurso? Para chegar a uma estimativa de valores a ONFIRE fez uma análise sobre os custos que uma carreira de um surfista júnior acarreta e o resultado foi o seguinte:
Competições
Correr os circuitos regionais, que dão acesso às provas nacionais dentro dos escalões júnior, as etapas da Liga MEO Surf e as provas do circuito Pro Junior Europeu são praticamente o básico do percurso competitivo dos juniores portugueses, com alguns a apostar também em provas QS em Portugal e resto da Europa. No entanto, para obter um número mais real e objectivo, apenas contabilizámos as provas realizadas em Portugal e excluímos as etapas do circuito QS.
– (3) provas regionais + (1) finalíssima nacional de uma categoria e deslocações.
120 euros (4 x 20 euros de inscrições, 40 euros de deslocações)
– (2) provas do circuito Pro Junior Europeu em Portugal e deslocações.
450 euros (inclui inscrições, fee anual da WSL e deslocações partindo de Lisboa)
– (5) etapas da Liga MEO Surf e deslocações.
600 euros (325 euros inclui inscrições e fee anual da ANS, 275 euros em deslocações partindo de Lisboa)
Total – 1.170 euros*
*Este valor poderá mudar dependendo da zona do país de um surfista e da capacidade de “gestão de recursos” dos mesmos.
Treinos
Há treinos e treinadores de todos os tipos e feitios. Um acompanhamento 3x por semana poderá custar a partir de 175 euros mensais, mais transportes, e poderá chegar até 500 euros mensais, dependendo da escola e do tipo de acompanhamento que o surfista requer.
– (12 meses de) acompanhamento por um treinador.
Total – Entre 2.700** e 6.000 euros
**não inclui preparador físico nem psicólogos desportivos, recursos que vários surfistas portugueses já têm ao seu alcance. Também não inclui estágios com treinadores “internacionais”.
Viagens (com treinadores)
, Indonésia, Austrália e Havai são viagens que fazem parte do curriculum de muitos dos melhores surfistas da nova geração, algo que já faz parte das suas rotinas anuais.
– (1) viagem/estágio a um dos destinos acima referidos.
Total – Entre 2.650** e 5.000 euros
Material técnico
Mesmo alguns dos mais conhecidos surfistas da nova geração não têm patrocínios de pranchas, apenas apoios, tendo muitas vezes que pagar o preço de custo em pranchas, fatos e acessórios.
– (4) pranchas e (2) fatos (a preço de apoiado).
Entre 1.200 euros e 4.000*** euros
***os surfistas que usam pranchas estrangeiras, ou mesmo nacionais de shapers internacionais, podem pagar um valor perto do que um consumidor “normal” paga, aumentando bastante este custo.
Extras (não incluídos no “orçamento” final)
– Acompanhamento por um vídeo maker com o intuito de criar conteúdo de uso imediato (redes sociais) e o “clássico” video edit no final do ano. Entre 1.500 e 5.000 euros (dependendo da qualidade da produtora e número de sessões).
– Factor família. Mesmo com treinador à disposição muitos atletas são acompanhados pelos pais e resto da família, tanto em competição como em viagens o que multiplica o valor das deslocações em causa pelo número de acompanhantes.
Contas feitas, o orçamento de um surfista com pretensões a fazer uma carreira profissional está entre os 7.720 e os 17.720 euros anuais. No entanto, fontes com conhecimento de causa próximas da ONFIRE apontam para números bastante mais altos, entre os 15 e 30k por ano, um valor que flutua de acordo com o acompanhamento que escolhem e viagens que fazem.
Na grande maioria dos casos é um investimento feito pela família dos próprios “futuros campeões”, apesar de já haver patrocinadores envolvidos. Os patrocínios dos surfistas mais novos variam muito, alguns envolvem apenas material técnico e roupa, um autocolante no bico e a esperança de ter “um pé na porta” no momento em que derem um salto qualitativo. Há ainda diversos surfistas que já contam com investimento financeiro da parte dos patrocinadores, mas consta que menos de 5% dos surfistas que estão neste tipo de programas em Portugal recebem o suficiente para cobrir todas as despesas. Há várias excepções, como os surfistas que são treinados pelos pais com alguma experiência nestas lides, e outros que cedo foram reconhecidos por patrocinadores que acreditaram nas suas carreira e apostaram num trabalho a longo prazo.
E se, por um lado o nível técnico dos surfistas portugueses nunca esteve tão alto, por outro serão muito poucos, por norma apenas um ou dois por geração, que chegam a ter impacto e fazer uma boa carreira como profissionais. Quem serão os sucessores de Tiago Pires, Frederico Morais, Vasco Ribeiro e Teresa Bonvalot, talvez os 4 mais bem sucedidos surfistas de sempre no nosso país, na próxima fornada?
(Guilherme Ribeiro, como Afonso Antunes, também está no topo da sua geração e é excepção à regra…)
Comentários
2 comentários a “Quanto custa apostar numa carreira de surfista profissional?”
Em suma , com tanta cagança e incutindo este espirito ” prozinho aqui do bairro ” nos miúdos … só surfam com trainadores e se forem filmados , com pranhas e fatos novos….é por essa razão que não temos um atleta nos sub 18 , ficámos em 10 lugar no ISA Junior e no QS ( excluindo Vasco , Kikas e Blanco ) os nossos atletas estão abaixo dos 100 primeiros.
Selecionadores nacionais que têm escolas de surf que são máquinas de fazer dinheiro… ( pensem )
Sinceramente acho que se está a gastar dinheiro com treinadores que de surf sabem zero… apenas usar uma máquina de filmar , pranchas muito menos, apenas querem trabalhar 4 horas por dia e faturar uma nota, vendendo o sonho aos país dos miudos ( surfistas frustrados que querem os os filhos sejam prós )
Em suma, muito resumidamente é isso que se passa na grande Lisboa , principal area de Portugal de formação de atletas.
Enquanto estiver assim a coisa , os nossos resultados são zero…
Já analizaram que os melhores juniores nacionais da actualidade não estão envolvidos na máquina de fazer dinheiro dos treinadores de surf ( Afonso , Guilherme e Martim , João Mendonça ( agora com Mouzinho ) sempre surfaram com os país … que sabem o que é surf )
Resumo , enquanto o circo continuar será resultado zero.
Caso o Vasco não entre brevemente , analisem daqui a quantos anos metemos um atleta no WT… possivelmente com o lobby Turismo de Portugal a injetar tanto dinheiro do contribuintes na WSL , ainda lá metemos um coxo á força.
Peço desculpa pelas palavras … mas se nelas veêm alguma mentira contestem-nas .
Abraço e BOAS ONDAS
Ola GL. Obrigado pela opinião, é válida como todas as outras. E sem dúvida que há excepções à regra, como os que mencionou e que, hoje em dia, é quase impossível apostar numa carreira de surfista profissional vindo de uma família de meios mais humildes. No entanto, apesar de ter havido alguns resultados recentes menos positivos, o surf português tem dado que falar a nível internacional, tem um surfista no CT e dois à porta (Vasco Ribeiro e Teresa Bonvalot). Mais ainda, é normal que de uma “fornada” apenas 1 ou 2 consiga ser destaque a nível internacional. O surf profissional ainda é relativamente recente no nosso país e não nos podemos esquecer que antes do Tiago Pires ter começado a sua “odisseia” no circuito mundial este patamar ainda era impensável para um surfista português. E só para terminar, de facto estão a ser feitos investimentos bastante “pesados” em surfistas muito novos mas se o fazem é porque querem e podem, não sei se é justo criticá-los. E não é nada que não aconteça em outros desportos como o golfe, vela, kart e muitos mais…
Abraço e boas ondas,
OF