Hoje em dia é difícil de acreditar mas Bruce Irons durante alguns anos chegou a ser tão mediático como Kelly Slater no seu auge. Apesar do seu irmão Andy se estar a estabelecer como um dos grandes nomes da sua geração, muitos apontavam para Bruce como um potencial campeão do mundo devido às suas incríveis peformances em ondas tubulares, aéreos altíssimos e estilo perfeito em ondas sólidas. Irons era o “rebelde sem causa” da época, com direito a secções de vídeo em todos os filmes de referência e fotografias em todo o tipo de revistas, fazendo com que muitas das grandes e pequenas marcas da época investissem fortemente para ter espaço nas suas pranchas.

Bruce era já um ícone do surf mundial mas os seus patrocinadores, e o público em geral, queriam ver se o hype era real ou não, se o havaiano era realmente tão bom em competição como os outros “grandes” da altura. E foi isso que o trouxe a Portugal em Setembro de 2000, para competir no Algarve Millennium Pro, uma das provas mais importantes do ano, equivalente a uma prova de 10.000 pontos nos dias de hoje. Na altura mesmos os profissionais mais conhecidos não viajavam com treinadores, o que fez com que o caçula dos Irons tenha arrancado sozinho para o nosso país. O seu patrocinador principal era a Volcom e foi pedido a um dos team riders portugueses da marca, Marcelino Barros “Bizuka”, que o fosse buscar ao aeroporto e o levasse ao evento. O detalhe é que “Bizuka” ainda não tinha carro próprio, nem carta de condução, o que fez com que decidisse recrutar o seu amigo e actual director de conteúdos da ONFIRE, que preenchia os requisitos mínimos de condução e viatura. Mesmo estando a competir no QS, Bruce era um daqueles surfistas de pouco acesso para o público em geral, o que fez da possibilidade de passar uns dias a surfar com ele, algo único. Mal sabíamos que a realidade seria um pouco diferente…

 

Algures em Setembro, no dia antes do início da prova, como combinado, esperámos o mais novo dos Irons no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa que surgiu das chegadas com apenas duas pranchas, uma mala e uma cara de quem fez directas consecutivas. Aparentemente foi mesmo isso que aconteceu, Bruce vinha de um Trade Show na Califórnia, onde houve mais party que trade com muitos dos maiores players da indústria. Assim que chegou ao carro o havaiano encostou-se para um lado e só acordou horas mais tarde, depois de uma travagem brusca na descida da Praia Amado. Assustado pela travagem e aparentemente sem saber onde estava no mundo, Bruce soltou um “what what” desorientado quando avisámos que tinha chegado à praia onde seria realizado o evento. Seguiu-se um “ah you guys go ahead, I’ll meet you there” antes de fechar os olhos. Depois de cerca de duas horas de surf voltámos ao carro para verificar se Bruce ainda mostrava sinais de vida e o que é certo é que, apesar do interior do carro se ter quase transformado numa sauna, o nosso hóspede acordou quando abrimos o carro.

Seguimos para o Surf Camp de Sérgio Wu, que na época era patrocinado pela Volcom, onde ficaríamos instalados pelos próximos dias. Para nós estava reservado um quarto com dois beliches, o que deve ter parecido um oásis no deserto para Bruce. Depois de tantas horas a “hibernar em aviões e carros”, e apesar de ser cedo no dia, “mergulhou” na sua cama e só saiu quando o acordamos para jantar algumas horas mais tarde. Ao jantar o formato foi o mesmo, Bruce conseguiu estar desperto tempo para comer, mas logo de seguida estava de volta ao seu beliche. Não sem antes se ter cruzado, no surf camp, com Coco Nogales, um surfista mexicano que no ano anterior lhe tinha apertado o pescoço, algo ligado a uma namorada que tiveram em comum, mas desta vez só trocaram bad vibes e cada um seguiu o seu caminho.

O dia 2 da passagem de Bruce Irons por Portugal foi mais activo. Depois de uma curta sessão de surf em ondas de meio metro, Bruce surfou no round 1 do campeonato onde perdeu em quarto lugar. De volta ao parque de estacionamento soltou um “this sucks, can we go to Lisbon?” Segundo o que nos contou, na viagem anterior ao nosso país, a sua primeira, tinha tido andado pela noite de Lisboa. Desta vez, como apagou no caminho, não tinha tido percepção da distância. “Three hours away? That suckssss”.

Pouco depois reencontrou o seu gang, começando por nos apresentar o Myles (Padaca), e de seguida fomos ter com os restantes ao hotel deles, Andy Irons, Chris Ward, mais dois surfistas do tour, um fotógrafo e a sua namorada. Seguiu-se uma sessão de várias horas de “cortar a casaca” típica, regada a vinho do porto e algumas substâncias vindas de Marrocos. Entre eles Andy, que era o único ainda em prova, era gozado pelos outros por (talvez pouco caracteristicamente) se estar a abster do álcool e drogas, optando por ficar a conversar connosco. Dois dias depois era vice-campeão do evento, atrás do brasileiro Marcelo Nunes. Andy tinha caído do tour no ano antes mas estava a receber alguns wildcards, e ainda esse mês era chamado para competir em Trestles, uma prova que venceu. Esta fase foi o início do primeiro comeback de AI, que logo no ano seguinte estava na disputa pelo título mundial, um feito que acabou por concretizar em 2002, 2003 e 2004.

Bruce no dia seguinte juntava-se a Myles Padaca e os dois voltavam para casa sem grande história para contar e com menos de uma hora e meia de surf entre eles durante toda a viagem. O mais novo dos Irons acabaria por se arrastar mais dois anos no QS, até conseguir a qualificação em 2003. Hoje em dia, quase 20 anos depois, está numa fase, no mínimo, decadente da sua carreira apesar de ainda manter algum reconhecimento do público. Bruce só voltou mais uma vez ao nosso país enquanto que Andy surfou o último heat da sua vida em Supertubos, em 2010

 

Comentários

Um comentário a “O dia em que levámos o surfista mais mediático do mundo ao Algarve…”

  1. Juca Morais diz:

    Lembro me perfeitamente na praia do amado desse dia. Acabei por falar um pouco com Andy e fazer uma foto com ele e vi o heat do bruce lembro me que estava com ma cara e nem falei com ele 🙂 , tambem estava o mick fanning.